/a psicanalista, a mulher, a interpretação.

 

a
psicanalista, a mulher, a interpretação. Françoise Dolto.

Jorge Forbes  

        O que vou lhes contar ocorreu na Maison Verte, instituição
parisiense de acolhimento de crianças de zero a três anos, criada pela
psicanalista Françoise Dolto. Quando na juventude de minha formação
psicanalítica, tive a oportunidade de passar algumas tardes naquele local,
acompanhando o trabalho de Dolto, já, então, ícone da psicanálise dita
infantil.

Em uma tarde,
um casal relativamente jovem chegou para a consulta com cara de desespero.
Traziam um bebê nos braços, o qual aparentava uma fraqueza importante. Deveria
ter uns três ou quatro meses de vida.

Dolto, cheia de
atenção vigilante e afetuosa, ficou sabendo dos pais que ao desespero da
criança que não comia, razão por estar esquálida, somava-se a preocupação com o
desemprego do pai, a sobrecarga da mãe, e as contas que não fechavam no mês.

Assisti, em
seguida, Françoise Dolto se dirigir diretamente ao bebê, sem qualquer atenção
ao fator compreensão, e lhe explicar, olhos nos olhos, que ela, Dolto, entendia
muito bem que ele não quisesse comer, uma vez que sua chegada poderia ser
pensada como em má hora, e que o melhor talvez fosse desaparecer. Contestou, no
entanto, afirmando que ele estava enganado, pois sendo tão querido e esperado,
sua morte precoce retiraria dos seus pais o único efetivo alento naquele
momento difícil de vida. E assim se despediu dos três – filho, mãe e pai –
dando-lhes um retorno para a semana seguinte. Quando saíram, Dolto me disse: –
“Você vai ver só o que vai acontecer”.

No segundo encontro,
confirmando a previsão da analista, eram outras pessoas que estavam ali. O bebê
estava comendo, e bem.

Ao final do
atendimento, a doutora me falou: -“Você viu como os bebês falam? Você viu a
prova?”. Aí, para mim, foi demais. Com a delicadeza devida, contestei que não
era que bebês falassem, mas que – como Lacan havia demonstrado no estádio do
espelho… – ao ela falar com o bebê, estava realmente falando a seus pais que,
por conseguinte, tinham mudado sua posição e possibilitado a alteração
sintomática.

Dolto não me
deixou avançar muito em minha peroração. –“Sim, sim – me
retorquiu – eu também conheço o ‘seu Lacan’ e bastante bem. Além de
companheiros de toda uma vida, somos mesmo muito amigos. Agora, que ele o diga
com o espelho, é interessante, quanto a mim, digo e mostro – como você viu –
que os bebês compreendem e sabem falar”.

Pano rápido.