/QUE TERROR!

não temos ideia de como, quando e aonde ele vai nos atacar

 

Jorge Forbes

 

Estamos sendo duramente apresentados a uma das formas do incompleto das nossas vidas, na figura desse vírus avassalador. Estamos em perigo! Freud diferenciava – em um texto escrito há exatos 100 anos, Além do Princípio do Prazer – três formas distintas de reagir ao perigo: Angústia, Medo e Terror.

Cito-o: “Angústia” designa um estado como de expectativa do perigo e preparação para ele, ainda que seja desconhecido; “Medo” requer um determinado objeto, ante o qual nos amedrontamos; “Terror” se denomina o estado em que ficamos ao correr um perigo sem estarmos para ele preparados, o terror enfatiza o fator surpresa”.

A atual pandemia nos aterroriza. É como se vivêssemos um combate de guerrilha. Nosso inimigo é pequenininho, sabemos da sua existência, mas não temos ideia de como, quando e aonde ele vai nos atacar. Ele nos surpreende dolorosamente.

Não é correto diagnosticar os efeitos psíquicos dessa pandemia como uma histeria. Ela é um terror. As reações a esse terror é que podem assumir matizes variáveis, entre outros: histéricos, obsessivos, perversos, paranoicos, psicóticos. Em uma situação dessas, cada pessoa vai escarafunchar em seus sintomas de base e os expressa.

O histérico pode dramatizar excessivamente esse momento, ou fazer o contrário, ficar indiferente (La belle indifférence). O obsessivo encontrará justificativa para suas manias de limpeza, de distância, de rituais, ou pode hipertrofiar a arrogância do ‘comigo ninguém pode’, do ‘eu sou imbatível’. O perverso terá dificuldade em disfarçar seu prazer sádico. O paranoico consolidará suas teorias persecutórias. O psicótico se verá tomado de sentimentos desagregadores.  Em ocasiões desestabilizadoras, como dito, a pessoa recua e hipertrofia seus sintomas mais habituais. É um mau tratamento do terror.

O que podemos almejar? Um duplo movimento: de um lado, no que é passível de compreensão, ganhar terreno sobre o terror invasivo transformando-o em um medo racional e objetivo. É o trabalho que médicos e profissionais de saúde estão fazendo. Que ninguém pense que do terror virá uma grande alegria. Bobagem. Se vier o medo, já teremos um caminho mais trilhável. Por outro lado, uma vez que o incompleto e a surpresa não vão desaparecer, é de se esperar um aumento da solidariedade humana, no momento em que um vírus desmascara nossa fragilidade constitutiva comum. O ‘eu preciso de você’ é universal e não local.

O que pode nos preocupar? Que esse momento de confiança no laço social seja abalado pelo desprezo de uma civilização que nos maltrata com suas respostas ruins, no limite, com a possibilidade da fome e da morte. Aí, se isso ocorrer, o terror se consolidará.